segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

À procura de amor!

Quando o sol cedeu seu lugar à noite e partiu para seu descanso, ele apanhou seus apetrechos e iniciou sua volta ao lar. A caminhada era longa, cansativa, e ele não tinha esperança de chegar em casa antes da meia-noite. Colocou nas costas uma sacola de roupas que ganhara de uma família, juntou nas mãos duas sacolinhas de alimentos e iniciou a caminhada. Uma chuva o impediu de caminhar mais rapidamente, mas ele só queria chegar em casa. A procura por um emprego foi, mais uma vez, desgastante. Enquanto esperava, debaixo de um abrigo de ônibus pela melhora do tempo, percebeu que o movimento nas ruas era grande: carros passando, buzinando, pessoas se saudando. Foi então que lembrou que aquela noite era importante: era noite de Natal! Era dia de confraternização, de abraços de paz, de amor, de felicidade!
Acelerou o passo para chegar logo em casa e foi cruzando com pessoas pelo caminho: algumas carregando pacotes com presentes, outras sorriam e se abraçavam, desejando feliz Natal. Nas casas, os pisca-piscas avisavam que  ali era noite de festa. Lembrou dos cânticos natalinos de sua infância e juventude e sentiu duas lágrimas fugirem de seus olhos, quando percebeu que há muito tempo não comemorava um Natal.
E sorriu! Sorriu porque teve uma brilhante ideia: pedir um prato aqui e outro acolá de comida quente, de comida preparada pelas famílias para festejarem o nascimento de Jesus. Fez o sinal da cruz e bateu na primeira casa. Quando alguém espiou pela janela, pediu: “tem um prato de comida para três crianças famintas?” A resposta foi um fechar brusco da janela. E voltou a caminhar. Bateu em mais uma, duas, três casas e percebeu que as pessoas não tinham nada a lhe oferecer. Sentiu dentro de seu coração a mesma tristeza do casal José e Maria quando procuravam um abrigo para o filho que iria nascer naquela noite. Sorriu de tristeza ao se comparar com este casal e percebeu que não tinha o direito de bater nas casas, pedindo comida, pois as pessoas estavam ocupadas, preparando as trocas de presentes.
A chuva já havia passado e, quando fez a curva na última esquina, avistou seu barraco iluminado, coisa que não via há tanto tempo. Preocupou-se com a saúde de algum dos filhos e correu, imaginando uma notícia dolorida naquela noite em que o mundo festejava e ele já não sabia o quê, pois se fosse o nascimento de Cristo, deveria haver amor entre as pessoas, mas não foi isso que sentiu quando bateu de porta em porta.
Só parou de correr quando colocou a mão no trinco da porta e se lembrou das sacolinhas sobre os ombros. Colocou-as no chão, forçou a porta e entrou! Mais lágrimas fugiram de seus olhos naquele momento, mas sentiu um aperto forte no coração: ao redor de uma pequena mesa, viu os filhos e a mulher e comida, muita comida! Esfregou os olhos para ver melhor e notou a presença das famílias dos barracos vizinhos. Todos haviam juntado um pouco do quase nada que tinham e se reuniram em sua casa para comemorar o nascimento do menino Deus. Abraçou os filhos soluçando, sabendo que não tinha como segurar as lágrimas, agradeceu ao aniversariante daquela noite e procurou esquecer os ricos sem tempo que cruzou pela estrada e que não tinham nada para lhe oferecer.
Foi em sua casa que encontrou união, afeto, amor. Foi em sua casa que percebeu que, ali sim, havia um Cristo nascendo no coração de cada um. E comemorou o nascimento deste Cristo, com a certeza de que, nesta noite, a vida, para todas estas pessoas, seria melhor!



(2° lugar no II Concurso Histórias de Natal do Movimento Vida Cristã, de 2004)

quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Presente para a vida

Sentou-se para jantar e percebeu que os filhos já tinham ido dormir e chorou sentindo que o tempo estava passando rápido demais e não conseguia acompanhar o crescimento dos três meninos. Olhou a esposa que tricotava no sofá, enquanto a televisão mostrava algo que ninguém estava vendo. O prato esfriava em sua frente, enquanto soava o nariz e procurava conter as lágrimas que, com certeza, iriam se misturar ao feijão ralo que flutuava no prato.
Sentiu-se velho, apesar de ter completado 40 anos dez dias atrás e ouviu um gemido vindo do quarto onde os garotos supostamente dormiam. Antes mesmo de se mexer na cadeira, percebeu a esposa acendendo a luz do quarto para ver o que acontecia. Carlinhos, o filho mais novo do casal, chorava de dor de estômago, por absoluta falta de alimento. O caldo de feijão gelava do prato e o homem já não tinha mais como comer, não tinha mais como conter a fome...
A vontade de morrer cresceu em seu coração, mas sentiu que, se o fizesse, sua família seguiria o mesmo caminho, pois dependia dele para viver. Sentiu, então, que era hora de mudar de vida. Se catar lixo já não rendia tanto dinheiro como imaginava, precisava modificar sua ação. Não adiantava ficar culpando o mundo pela sua falta de sorte na luta para ganhar dinheiro. E mudou...
Nem bem amanhecera o dia, lá estava ele nas ruas, batalhando um emprego melhor. Sentiu que se oferecendo para fazer não resolvia, tinha mesmo era que agir. E o fez...
Enquanto recolhia lixo que seria vendido como reciclado mais tarde, limpou o jardim de uma casa, cortou galhos de uma árvore em outra e ganhou por isso. Se sentiu feliz ao chegar com mais dinheiro em casa naquela tarde e convenceu a mulher de que o tricô também poderia ser um motivo de melhorar o rendimento da família. O garoto mais velho, apesar de 11 anos, montou, com restos de madeira, uma caixa de engraxate e, depois da aula, corria à praça para trazer trocados para os pais.
Uma semana depois percebeu que o sol sorria no céu, mostrando que o importante era enfrentar as nuvens escuras se quisesse brilhar.
E naquele Natal, quando percebeu que a família rezava em volta do presépio, montado com peças feitas com material reciclado, surpreendeu a todos com um presente para cada um, inclusive para a esposa. O choro, agora, abraçado à família, era de alegria! Um choro de coragem, de conquista, da certeza de que as dificuldades só são superadas com perseverança e ação.

Foi seguindo seu exemplo que os filhos cresceram e ajudaram a transformar o mundo de miséria em fartura. Mesmo que o mundo fosse apenas aquela pequena família...