quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

No Dragão Mecânica

Domingo de manhã, depois da missa das crianças e da reunião da Cruzada, ainda tinha muita coisa para acontecer, antes do almoço. E o almoço saía, pontualmente, ao meio-dia. Já em casa, e de roupa trocada - a de missa voltava para o guarda-roupa - lá ia eu e o Ademir ao campo do Dragão Mecânica, na Vila Progresso. Bem em frente à padaria União e que terminava na rua José Maria Marin. Meu time do coração era o Primavera, principalmente porque tinha, entre seus jogadores, Jayme e Bruno, dois irmãos que "gastavam" a bola.
Sentava no barranco e ficava vendo o jogo, esperando a hora de vibrar com os gols. Quando me desinteressava pelo futebol, corria até os eucaliptos e ficava olhando o céu, as nuvens, sentindo a manhã passar...
O campo hoje não existe mais. Deu lugar à ampliação da Sifco, que comprou a Mecânica. Apesar da preferência por outro time, gostava também do distintivo do Dragão Mecânica. Ficava admirando a figura do bicho que soltava fogo pela boca. Mas ficava entusiasmado mesmo com o toque de bola dos dois irmãos que, durante a semana, trabalhavam na venda do seu Valentim. Era comum, quando lá ia eu comprar feijão, arroz ou farinha para o almoço, ouvir os dois comentando com algum freguês como tinha sido o jogo do domingo. E lá ficava eu observando os detalhes e lembrando daquilo que tinha assistido.
Algumas vezes me aproximava da mesa colocada do lado de fora do campo para acompanhar a transmissão do jogo pela Difusora. Ali não tinha cabine para a transmissão e o locutor ficava sentado sobre a mesa para poder ter uma visão melhor do jogo, enquanto o "repórter de campo" ficava sentado no chão, ao lado do gramado.
Acho que foi por causa disso que surgiu em mim a paixão pela informação. Tanto que meu primeiro emprego na área de jornalismo foi numa emissora de rádio, mas escrevendo eu me sentia melhor, principalmente porque tinha vergonha de falar em público.
O público não era grande, mas as brigas também aconteciam. Cheguei a ver torcedor rolando o barranco, pois não haviam arquibancadas montadas. No barranco faziam-se degraus onde a torcida sentava. E o torcedor tinha que levar jornal ou papelão para não sentar diretamente na terra.
Era por causa das brigas que minha mãe dizia para termos cuidado. Ademir a tranquilizava, dizendo que tomaria conta de mim. E lá ia eu, satisfeito, com tanta proteção.
Quando fiquei sabendo que o campo seria destruído, para ampliação da fábrica, confesso que chorei. Marcaram o último jogo, a torcida lotou o "Dragão Mecânica", mas não tive coragem de assistir ao jogo. De casa, ouvia os gritos da torcida, já que o "Dragão Mecânica" ficava a cem metros, no máximo, de onde eu morava.
Foi aí que comecei a perceber que as coisas boas da vida não ficam paradas no lugar. Vão embora, dão lugar ao progresso. Claro que outras coisas boas aparecem em nossas vidas, mas marcas da infância ficam para sempre!
E hoje, cada vez que passo em frente ao local onde existia o campo, paro para ouvir os gritos da torcida, vibrando com os gols, xingando o juiz ou sofrendo com os lances perdidos. E retomo o caminho com um sorriso nos lábios, balançando a cabeça e remoendo o cérebro para agradecer a Deus o tempo que ali vivi...

Um comentário:

  1. Nelson, lendo sua crônica, me transportei para a infância, na casa da minha tia Vergínia, onde fazíamos bolinha de sabão com canudinhos de mamão. Lembro até hoje do gosto do leite amargo e amarrento do mamão. Também acendíamos cigarros com talinhos secos de xuxu.
    Abraço
    Capitão

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