quinta-feira, 25 de junho de 2015

PERSONAGENS (14) Os “causos” de Aparecida Mariano

Conheci Aparecida Mariano de Barros na Academia Jundiaiense de Letras onde entrei em 2002. Claro que demorou um tempo para a gente interagir, mas as conversas giravam em torno das crônicas que eu publicava no Jornal de Jundiaí, no caderno Leitura de Domingo que desapareceu com o tempo. Mas no início ela confundia as pessoas: achava que o autor era outro acadêmico. Até o dia em que nós três conversamos sobre o assunto. E aí, sempre que haviam reuniões ela se dirigia a mim, para comentar as crônicas publicadas desde a última vez que nos vimos.
A conversa de Aparecida girava sempre em torno dos “causos” vividos por ela, principalmente em Piracicaba, onde nasceu. Uma memória prodigiosa desta mulher que mantinha o sorriso nos lábios durante sua narrativa, cheia de interpretação. Mariana era uma das mais ativas acadêmicas: todo ano tinha um livro publicado, com poesias doces, assim como ela era. E neste seu jeito de ser, sempre que nos víamos, me puxava pelo braço e perguntava “quanta doce de formol tomou agora pra ficar assim tão jovem?” E mesmo dizendo que isso era delicadeza dela, trocávamos ideias sobre causos e histórias de nossas infâncias. Eu, nas registradas nas crônicas publicadas no jornal e ela rememorando “causos” que lhe provocavam risos.
Livros, trovas e poemas premiados, transformaram Aparecida numa personagem cheia de alegria nas reuniões acadêmicas. Não havia uma reunião que ela não se pusesse de pé para ler um poema, declamar uma poesia decorada ou contar um “causo” – num linguajar sertanejo – que provocava risos, mas muitos aplausos dos presentes.

Aparecida era assim... Uma pessoa cheia de vontade de viver. Claro que vontade não se perpetua e todos fazem por este mundo uma passagem dentro de um período determinado. E Aparecida se foi não faz muito tempo. Deixou um vazio nas reuniões acadêmicas, mas aquele sorriso ao término de mais um “causo” registrado por ela, ainda é refletido na sala Professor Jahyr Accioly, no Museu Histórico e Cultural de Jundiaí onde ocorrem as reuniões acadêmicas, sempre nos segundos sábados de cada mês.

quarta-feira, 10 de junho de 2015

PERSONAGENS (13) O dentista poeta Romão de Souza

Os primeiros versos me foram entregues por Nelson Cardin, um amigo de ambos. “Xará publica que é muito bonito”. Me disse ele. Depois de ler, perguntei se o poema era dele, mas com um sorriso disse que não, mas que eram do presidente. “Do doutor?” perguntei. E o sorriso do Xará confirmou minha suspeita. Li novamente os versos e no domingo lá estavam eles estampados na página do jornal. E na segunda de manhã atendi o telefonema do dentista poeta e presidente do Clube Jundiaiense, Romão de Souza. “Ei, quero agradecer isso aí, mas não fui eu quem enviei os versos, nem sabia que tinham sido roubados de minha mesa”, me disse ele às gargalhadas! O fato é que este foi nosso primeiro contato e a partir daí nossa amizade foi se consolidando. Tanto que meses depois lá estava eu em seu consultório discutindo a criação do Jornal do Clube Jundiaiense. Isso lá atrás, em 1976.
A partir da aprovação da criação do jornal e do início das publicações, as reuniões foram mais constantes, apesar de muitas delas serem por telefone, graças ao pouco tempo que o presidente dentista e poeta dispunha para deliberar sobre publicações. “Façam aí, o Cardin sabe do que gosto, então... podem publicar tudo. Só não falem mal de mim!” completava ele sempre às gargalhadas!
A alegria do dentista e sua disponibilidade eram constantes. Certa vez, numa manhã de sábado, mesmo estando ele no Clube e eu necessitando de seu serviço dentário, correu ao consultório para me atender. “Afinal – dizia ele – jornalista não pode ter dor de tente em dia de trabalho!” Claro que o sorriso voltou aos seus lábios mais uma vez, mas me lembro que na saída, depois que perguntei o preço dos serviços, ele colocou um papel dobrado em meu bolso e simplesmente disse: “se achar interessante, publique!” Agradeci, deixei o consultório, a gargalhada não se fez presente, mas no outro final de semana, lá estava estampado no jornal mais um poema do amigo.
Nunca o vi na redação. Afinal, como já disse acima, seu tempo era pouco. Mas sempre achava um jeito de fazer a notícia chegar ao jornal. Quer através de amigos, quer através de um telefonema.

Passou o tempo, deixei Jundiaí, Romão chegou à Academia Jundiaiense de Letras, mas um acidente o tirou do convívio. Fiquei sabendo de sua partida quando voltei a Jundiaí, depois de 15 anos em Campinas. Outro dia, folheando uma coletânea da Academia Jundiaiense de Letras encontrei um poema do dr. Romão. “Vi uma nuvem passando, pedi carona, ganhei e voei com ela por um tempo infinito!” dizia o primeiro verso. Me lembrei da gargalhada, do agradecimento. Coincidência ou não eram estes versos que anos atrás foram publicados no jornal onde trabalhava. Os mesmos que foram “roubados” de sua mesa de trabalho. E me veio à mente este homem forte, inteligente, responsável. Que fazia as coisas acontecerem. E sempre com aquele olhar bonachão e o sorriso nos lábios!