terça-feira, 28 de julho de 2015

PERSONAGENS (18) O bom humor de Arquimedes

Conheci Arquimedes, que nasceu Lázaro de Almeida, na rua Moreira César, Vila Arens, num local onde sempre foi farmácia, mesmo tendo mudado de nome algumas vezes e que naquele tempo se chamava Farmácia Progresso. E o tempo é antigo: década de 1950. Ele era o farmacêutico que todo mundo achava ser o médico do bairro. Atendia a todos com a mesma dedicação e sempre sorrindo. Ouvia com seriedade os relatos do paciente e sorria ao diagnosticar o problema e fazer a medicação. Mas não era só isso que ele fazia. Mas vale dizer que tudo que fazia, tinha a mesma atenção, dedicação e cuidados!
Foi ele quem cuidou de meu irmão mais velho, quando este se machucou, quando criança, num arame farpado e precisou dar um ponto no braço. Os farmacêuticos também faziam isso na metade do século passado!
Se sua farmácia estava sempre cheia de pessoas que buscavam seu diagnóstico, sua sala, na Câmara de Vereadores não era menor. Imagino que tenha sido o vereador que mais vezes ocupou a presidência da Casa. Era ali que eu também o via, nos tempos de rádio Santos Dumont e que acompanhava as sessões da Câmara. Chegava ao local sorrindo, sentava na cadeira da Presidência e se transformava no competente vereador que sabia comandar os colegas de parlamento. De sua cadeira, visualizava a equipe de jornalistas no local. Acenava para todos com seu sorriso para, no minuto seguinte, abrir pastas e mais pastas e dirigir os vereadores presentes, ler projetos, aprovar, interromper discussões, enfim faz o papel de presidente! E se foi o vereador que mais vezes foi presidente da entidade, com certeza Arquimedes está entre os mais vezes eleitos.
E se já cruzava com ele quer na farmácia, quer na Câmara, o via também no Salão Paroquial de Vila Arens. Afinal, era ele quem comandava as festas ali realizadas, principalmente de aniversários dos padres salvatorianos que dirigiam a igreja do bairro. O salão estava sempre lotado nestes dias e, entre uma apresentação e outra – quer pequenas peças de teatro, apresentações musicais ou declamações de poesias – Arquimedes se apossava do microfone e fazia a plateia rir com piadas e “causos” que sabia contar como ninguém.  Mas Arquimedes não foi só isso: chegou a ser presidente do Paulista, do Ipiranga, que era praticamente em frente à sua farmácia. Além disso, o projeto de criação da Guarda Municipal de Jundiaí é de sua autoria.

 Quando deixou o Legislativo de Jundiaí, imagino que no início da década de 1980, eu já não morava na cidade, pois me casara e mudara para Campinas. Não soube, também, de sua partida, mas quando retornei a Jundiaí, já na década seguinte, sua farmácia tinha fechado, mudado de nome e ele não estava mais por aqui. Apenas tivera, como homenagem, dado seu nome ao prédio da Câmara de Vereadores, perpetuando seu trabalho na cidade.

quarta-feira, 22 de julho de 2015

PERSONAGENS (17) O comendador Gumercindo Barranqueiros

Conheci o comendador Gumercindo Barranqueiros quando consegui meu primeiro emprego com carteira assinada. Isso foi no ano de 1968, quando fui trabalhar na Rádio Santos Dumont de Jundiaí. Entrei para pedir emprego na técnica de som e o locutor do horário me colocou no estúdio. Li meu primeiro texto no ar e cinco minutos depois, um rosto apareceu do outro lado do estúdio, na técnica de som e desapareceu. Arrumei o emprego e o locutor me informou que o rosto que apareceu ali era do “dono da rádio”. Imaginei que fora aprovado por ele.
Alguns dias depois acabei cruzando com o comendador nos corredores da rádio que ficava na rua Barão de Jundiaí, em frente à rua Coronel Leme da Fonseca onde hoje tem uma loja da Casas Bahia. Na parte de frente do prédio havia um auditório onde aconteciam programas ao vivo e, ao lado, um portão que levava até os estúdios, subindo uma escada de sete ou oito degraus. Do lado direito, descendo três degraus era o acesso à casa dos Barranqueiros, donos da rádio. Eram poucas as vezes que o comendador subia até a rádio. E eram também poucas as vezes que o via nos corredores. Mas sempre tinha uma frase quando conversava com algum funcionário da emissora e sempre completava: “no meu tempo de rádio em Itu...”
Quando havia transmissão externa de jogo – e eu fazia o plantão esportivo – ficava observando, do estúdio, a correria para colocar os locutores no ar. Como o Paulista disputava, na época, o acesso à divisão principal, era fundamental a transmissão dos jogos. E quando se aproximava o horário do jogo e a ligação telefônica para a transmissão não se completava, via-se, entrando na técnica de som o comendador: tipo bonachão, simpático, sempre com um ar sério no rosto, mas um sorriso escondido para explodir na hora de o problema estar resolvido. Sentava na técnica, enquanto alguém seguia suas instruções. Plug daqui, plug dali e... “Boa tarde ouvintes da rádio Santos Dumont...” Quando o locutor iniciava a transmissão, o comendador se levantava sorrindo, acenava para o estúdio onde eu e seu filho Claudinê estávamos e descia para sua casa. Claudinê deixava o rádio de pilha comigo, sintonizado nas emissoras da Capital e também ia embora.
Ver o comendador nos estúdios era difícil, mas ouvi-lo falando em sua casa, na parte debaixo do prédio, não era. Ele estava sempre por ali. Voz forte, grave, era ouvida sempre com um comentário sobre alguma música que estava tocando ou sobre a notícia que acaba de ser lida no ar. Como eu tinha um programa que entrava no ar diariamente às 17 horas, mas chegava à emissora às 14, parte de meu tempo ficava na discoteca, selecionando os discos e as músicas para serem apresentadas depois, e era dali que se ouvia os comentários do comendador, principalmente com respostas de dona Paulina, sua esposa.

Não me despedi dele quando deixei a rádio no final de 1969, quando fui trabalhar como revisor no Jornal da Cidade, mas me lembro que alguns anos depois, seu filho Péricles me ligou para informar o falecimento de seu pai. E fui que publiquei nota, informando de seu repentino falecimento. Um enfarto fulminante levou o homem de voz forte, jeito bonachão e que gostava de contar histórias de seu tempo de trabalho na rádio de Itu.

segunda-feira, 13 de julho de 2015

PERSONAGENS (16) A alegria interrompida de Fábio Pontes

Conheci Fábio Pontes de Oliveira em 1997, quando trabalhamos juntos na Assessoria de Imprensa da Prefeitura de Jundiaí. Fábio chegou como diretor, demonstrando competência e conquistou a equipe com seu sorriso permanente e uma alegria enorme de desenvolver projetos e trabalhar para que a ação de todos atingisse o objetivo maior que era atender bem os colegas de imprensa da cidade.
Sempre disposto a grandes ações, foi um dos organizadores e idealizadores de um encontro de comunicadores da cidade realizado um ou dois anos depois. Fez uma festa enorme na sala da Assessoria quando fui premiado no Primeiro Concurso de Romances da cidade. Exigiu matéria distribuída à imprensa com fotos, espalhou cartazes pelo local, me deixando inibido, diante de tanta felicidade. Ligou para os jornais para pedir destaque na reportagem, enfim festejou minha conquista.
Em 2000 deixei a Prefeitura para assumir a chefia de redação do Jornal de Jundiaí, houve nova eleição e Fábio foi elevado à função de Diretor de Cultura da cidade, mostrando, também ali, competência na realização de seu trabalho.
Perdemos o contato durante muito tempo e só fomos nos encontrar dez ou onze anos depois, quando Fábio foi morar perto de minha casa. Começamos a ir ao trabalho de ônibus e nos encontrávamos no ponto. Conversávamos sobre o final dos anos 90, imaginávamos o futuro. Mas o futuro não foi muito longo. Uma viagem sua à Fortaleza no final de 2011 para passar por lá o Reveillon não lhe permitiu chegar a 2012. Seus sonhos e projetos se afundaram numa onda qualquer que decidiu interromper sua caminhada e barrar sua alegria de viver.
Quando José Carlos Sacramoni me ligou na tarde do dia 27 de dezembro de 2011 para me dizer que você tinha partido, perguntei a ele se era você mesmo. Afinal, tinha te visto no dia 24, subindo a rua de sua casa, quase ao lado da minha. E me lembrei das manhãs em que nos víamos. Um dia desses passei diante da casa onde você morou. Senti um vazio enorme naquilo tudo. Percebi que faltava a presença de seus quase dois metros de alegria e sorriso. Senti que o sol, neste dia, não quis atrapalhar o momento de reflexão. Me lembrei de sua partida quando percebi que Deus, em sua infinita misericórdia, abria os braços pra te receber.

E me fiz calar e refletir sobre o tamanho deste mundo, a rapidez de nossas vidas e uma saudade muito grande bateu forte dentro do meu peito. Sei que aquele ponto de ônibus não vai ter mais sua presença nas manhãs diárias, quando buscávamos nossos trabalhos. Mas sei, também, que vou sentir sua presença e seu sorriso, toda vez que passar por ali. 

quinta-feira, 2 de julho de 2015

PERSONAGENS (15) Minha madrinha Olga Mathion

Olga Mathion apareceu em minha vida quando comecei a publicar minhas crônicas no Jornal de Jundiaí, no caderno Leitura de Domingo. Sempre que um texto meu saia publicado, ela aparecia na portaria do jornal, deixando um envelope, com um recado. E o recado era uma ou duas linhas de textos ou apenas uma pequena frase. Certa vez, quando o texto falava sobre “Bolinha de Gude”, o envelope continha uma, colada num folha de recados em branco. Olga sabia que o recado estava dado.
Escritora e integrante da Academia Jundiaiense de Letras, uma bela tarde me ligou para me convidar a fazer parte do grupo. Preocupada, disse que não precisava fazer nada especial, a não ser preparar um currículo e anexar obras publicadas. Ela mesma montou o processo e, dias depois, ligou para me informar a data de minha posse.
Agora minha ‘madrinha’ da Academia, Olga não perdia uma reunião mensal, na maioria das vezes acompanhada por sua irmã. Numa das reuniões, me lembro que um dos acadêmicos comentou sobre uma de minhas crônicas publicada no domingo anterior e lamentou que tal texto não poderia ser lido, pois não tinha o mesmo em mãos. Me pareceu que a informação foi a “deixa” para Olga. Ela levantou-se no meio da sala, abriu a bolsa e retirou a página de jornal. “O texto está aqui, trouxe comigo”, disse ela. Seu ato mereceu aplauso dos presentes e não vou comentar aqui a leitura feita pelo acadêmico que comentara o texto e as opiniões sobre isso. Apenas lembro que, ao final da reunião fui ao encontro de Olga para agradecer todas as gentilezas e o carinho que tinha para comigo.
Seu sorriso foi sua resposta!
Numa das reuniões me presenteou com um livro onde, em crônicas, o autor fazia referência à sua infância, numa forma parecida com meus textos que relembravam o passado. “Faça um livro com seus textos”, me disse ela. Foi o que fiz anos mais tarde!

Mas – e sempre surge um triste mas... - Olga Mathion partiu, deixando um vazio enorme dentro dos escritores da cidade. Com grandes obras publicadas, Olga passa todos os dias pela minha memória. E todo mês, na hora das reuniões dos acadêmicos, olho junto à porta da sala de reuniões do Museu Histórico e Cultural de Jundiaí, na primeira fileira, e vejo o lugar vazio onde Olga costumava sentar. E os bilhetes circulam por minha mente, lembrando o carinho e a doçura desta mulher que se imortalizou dentro do meu coração.