sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

O primeiro genro de dona Graciosa

Conheci Décio Araújo logo que comecei a namorar a Rita de Cássia, hoje minha esposa, em 1976. Advogado, com escritório e residência em São Paulo, doutor Décio (como eu o costumava chamar) era casado com Virginia, irmã da Rita e filha mais velha de dona Graciosa, minha sogra. Doutor Décio gostava de dizer que era o genro preferido de dona Graciosa. Afinal, era o primeiro. Depois veio Orides, que se casou com Márcia e eu cheguei por último, casando com a Rita. Apesar de morar em outra cidade, praticamente toda semana ele estava em Jundiaí e depois em Campinas onde fui trabalhar e morar e levei meus sogros comigo. A conversa girava em torno de política, mas principalmente de futebol e do Palmeiras. Com exceção de Orides, que era corintiano, nós todos éramos palmeirenses. Foi Décio quem me levou algumas vezes ao Parque Antártica, nos tempos da Parmalat e vibramos com alguns títulos conquistados na década de 1990. Sempre que chegava em casa, Décio fazia questão de cumprimentar dona Graciosa em primeiro lugar, chamando-a de “minha querida sogra!” e se auto denominar o “genro preferido dela!”, provocando risos em todos. Por ser nosso padrinho de civil, doutor Décio fez questão de oferecer sua casa em Caraguatatuba para passarmos nossa lua de mel e foram muitos os feriados prolongados que visitamos aquela região e depois em Itanhaém, do outro lado do litoral de São Paulo. Depois que dona Graciosa partiu, no Carnaval de 2008, as visitas diminuíram um pouco, mas voltaram a se tornar mais constantes quando seu Alcides, meu sogro, adoeceu. E aí não eram só nos finais de semana que ele e Virgínia estavam em casa. Isso foi até o Carnaval de 2013 quando, na Quarta-feira de Cinzas seu Alcides partiu. A partir de então, as visitas diminuíram, e bastante. Já cansado e meio doente, doutor Décio vinha pouco a Jundiaí. E se meus sogros partiram numa época parecida – o Carnaval – Décio mudou completamente as datas e foi embora na véspera de Natal de 2017. Mas refletindo aqui, com Rita, minha esposa, chegamos à conclusão de que, ao chegar no céu, Décio foi recebido e abraçado por dona Graciosa, afinal era ela que, segundo ele, o tinha como o genro preferido!

quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Pagando a compra com caderneta

Fazer compras hoje em dia pode ser difícil porque o dinheiro está curto, mas temos muitas opções de pagamento: talão de cheque, dinheiro, cartão de débito ou cartão de crédito. Comprar fiado, hoje em dia, é muito complicado. Afinal, quem garante que vai receber? Digo isso porque na minha infância, no final da década de 1950 e início de 1960, havia muita compra que era paga somente no final do mês. E eram poucas as garantias: apenas uma caderneta! Isso acontecia na mercearia, no açougue, na padaria e até no armazém. Alguns desses comerciantes tinham o controle das compras, mas quem marcava na caderneta corria o risco de nunca mais ver a cor do dinheiro. Mas tinha o comércio onde havia uma placa afixada com as palavras: “Fiado só amanhã!” ou ainda: “Não vendemos fiado!” e ambas eram completadas por “Favor não insistir!” E as compras, lá em casa, eram sempre feitas com dinheiro vivo! Despesa do mês era feita do Empório Bizarro, em frente à Igreja da Vila Arens, mas no dia a dia, minha mãe mantinha uma pequena caneca no armário da cozinha onde ficavam alguns trocados, para compras de última hora, principalmente no armazém do seu Valentin que ficava na rua da Várzea, bem em frente ao campinho das casas da Vila Agrícola, na Vila Progresso. Mas além do Bizarro, onde a conta era alta e paga à vista, tinha também a feita diariamente na Padaria União, na avenida São Paulo, bem em frente ao Campo do Dragão Mecânica. Pão e leite eram comprados toda manhã e, na hora de pagar, entregava-se a caderneta para a moça do balcão que ali marcava a compra e o valor. E assim passava-se o mês. Todos nós gostávamos de pegar a caderneta e comprar o pão ou o leite ou, às vezes, os frios para um lanchinho de final de tarde. Mas lanchinho para seis irmãos virava uma refeição cara! E tudo isso era marcado na caderneta. Meu pai não usava a caderneta no dia a dia, apenas na hora de somar os valores para fazer o pagamento e era ele e meu irmão mais velho, Ademir, que faziam a conta. Sabíamos que era hora de pagar quando víamos os dois somando os valores. Valor calculado, dinheiro colocado no meio da caderneta, era hora de pagar. E quem mais gostava de fazer isso era eu! Gostava de pegar a caderneta com o dinheiro, chegar no balcão da padaria e entregar no caixa. Tinha a impressão de que os outros fregueses ficavam olhando uma criança de 8 ou 9 anos pagando as compras do mês. Valor somado na calculadora do balcão, dinheiro entregue, caderneta paga e rasgada. Voltava para casa com outra caderneta novinha. E feliz porque tinha feito o pagamento da conta. Mais feliz ainda porque o dono da padaria dava meia dúzia de balas de mel. Uma espécie de “incentivo” pela conta paga. E a alegria se completava quando chegava em casa e dividia as balas ganhas entre os irmãos. E como meu irmão mais novo só nasceu em 1963, sobrava sempre uma bala a mais para mim. Ademir, Ana, Toninho e Osmar se contentavam em ficar com uma bala. Mas muitas vezes eu fazia questão de dar uma para minha mãe. E esperar mais um mês passar, só pra pagar a conta no balcão da padaria mais uma vez...