quarta-feira, 30 de março de 2016

Antes do Velório Municipal

Até a década de 1970 Jundiaí não tinha seu velório municipal nem seu serviço funerário. Existiam na cidade, nesta época, duas funerárias: Madeira, localizada na rua do Rosário, na praça Governador Pedro de Toledo,e a Bonifácio, localizada na rua Vigário JJ Rodrigues, esquina com a rua Secundino Veiga. Além destas duas, surgiu nesta época, mas por pouco tempo, uma na Vila Arens, na avenida São Paulo. O movimento maior era por conta da Funerária Bonifácio, mas os dois serviços eram executados por empresas familiares, muito comuns nos últimos tempos. Quando falecia alguém, a cidade era forrada de papeis anunciando falecimento, era preciso anunciar também nas emissoras de rádio e os velórios eram realizados nas casas dos falecidos. Um pano preto do tamanho da porta da casa, com uma cruz enorme desenhada no meio dele, era fixado em local estratégico, para anunciar que ali havia um velório. Até o ano de 1973 só havia o cemitério Nossa Senhora do Desterro, na região central da cidade. Neste ano foi criado o Cemitério Nossa Senhora do Montenegro e só depois surgiu o particular, Cemitério Parque dos Ipês. Casas com grandes quintais acomodavam os visitantes enquanto esperavam a saída do enterro, mas as menores eram difíceis: era comum ver um grande número de pessoas próximas à rua, principalmente casas onde a porta da sala era na calçada, com o pano preto balançando ao vento. Lembro-me de parentes de falecidos que durante três noites após o sepultamento, rezava-se o terço. Em outras o terço se prolongava até a missa de sétimo dia. Tudo pelo descanso eterno do parente. O carro fúnebre chegava à residência do falecido meia hora antes da partida do féretro. O número de pessoas e carros começava a crescer nas redondezas. Havia lugares que o trânsito ficava impossível. E o enterro saía exatamente no horário marcado. O último, sempre por volta das 16 horas. Para dar tempo de chegar ao cemitério e efetuar o sepultamento, antes da noite cair. Hoje, a maioria dos velórios acontece junto ao cemitério do sepultamento. Até para evitar trânsito. Claro que já se anuncia mais um cemitério particular na cidade, mas isso é por conta do crescimento da cidade, cuja população já ultrapassa os 400 mil habitantes. Mas é sempre saudoso lembrar dos velhos tempos de velórios na cidade e das famílias Bonifácio e Madeira responsáveis pelo procedimento de sepultamento.

segunda-feira, 14 de março de 2016

O sorvete de abacate

Tem coisas que acontecem na vida da gente que não esquecemos. Por mais que o tempo passe, por mais distante que o fato fique da atualidade, não tem como: não dá para esquecer! E este fato ocorreu na metade do século passado, quase no final do milênio! Já contei aqui que o quintal de minha casa tinha um verdadeiro pomar e uma horta de dar água na boca em qualquer um. E era no fundo do quintal que existia um pé de abacate enorme. E carregava todo ano! Era tanto abacate que eu e meus irmãos saíamos vendendo na vizinhança! O pé era enorme: imagino que mais de dez metros de altura e difícil de alcançar os galhos mais altos. O galho mais baixo estava a mais de três metros do solo e era difícil subir por causa do tronco: ninguém conseguia abraçar o mesmo... Para colher a fruta, meu pai arranjou um bambu enorme, colocando na ponta do mesmo uma caçamba para segurar o abacate. Na hora da colheita, eu era um dos chamados por meu pai para ajudar. Sacola na mão e correndo para tirar o abacate colhido na caçamba. Sacola cheia, serviço feito! Agora era consumir ou vender até que... até que um belo dia chegaram em casa os irmãos Walter e Geni. Ele, mais velho, amigo de meu irmão mais velho, Ademir. Ela, um pouco mais nova, amigo da minha irmã, um pouco mais nova que Ademir, Ana Maria. E Geni se entusiasmou com o tamanho da fruta e a quantidade. Foi aí que ela teve a ideia e sugeriu: “por que vocês não fazem sorvete de abacate? Tenho geladeira em casa, posso fazer pra vocês!” Naquela época, final da década de 1950, geladeira e televisão eram raros nas casas das pessoas. Televisão virou televizinho e geladeira a gente trocava por refrigerantes gelados, no bar da esquina... Claro que a sugestão foi aprovada e aceita por todos. Manhã de sábado, pai e filhos no quintal colhendo abacate, colhendo abacate, colhendo abacate! Sacolas cheias e os irmãos que eram amigos levaram as sacolas com a fruta que se transformaria em sorvete! Walter e Geni moravam na mesma rua que nós, um quarteirão pra frente, vizinhos do açougue do Iotti que existe até hoje. Fruta entregue, os irmãos Walter e Geni convidam para saborear o sorvete na tarde de domingo, vendo televisão. E no dia e horário lá estávamos nós: eu e meus irmãos para saborear sorvete de abacate. O combinado era que traríamos um pouco para nossos pais. Para que ninguém ficasse sem. Sentados na sala, vendo televisão: não me lembro do programa, pois a atração era o sorvete que estava saindo do congelador! E lá vem Geni com o produto para ser distribuído para todos. E é aqui que veio minha decepção: sorvete feito nas formas de gelo e distribuído – dois ou três cubinhos numa tigela e uma colher. Era com a colher que levávamos o sorvete à boca para sentir o gosto, lamber ou chupar e devolver na tigela. Minha decepção não foi com o sabor do sorvete; viro para minha irmã e pergunto: “Por que não tem palito?” A pergunta tinha sua razão de ser, afinal, sorvete tinha que ser de palito, já que não existia, naquela época, receita de sorvete de massa. Ana Maria sorri e diz que era só ter colocado o palito que ficava sorvete de palito. Mas voltei a questionar, principalmente por conta do tamanho do mesmo, já que as formas de gelo eram de cinco centímetros de altura, pequeno para os palitos de sorvete. Saí dali decepcionado, querendo sorvete ‘de verdade’. Lembro que meus irmãos voltaram para casa comentando o sabor e este retorno tinha que ser rápido, para que os sorvetes de meus pais não derretessem. Foi só em casa que me conformei com a ausência do palito, ao ganhar mais dois cubinhos – um de meu pai e outro de minha mãe - de um sorvete incompleto!