quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Os aniversários onomásticos

A palavra pode parecer estranha, de difícil entendimento, mas desde pequeno me acostumei com ela. O pequeno que quero dizer é quando eu tinha 9 anos, fiz a Primeira Comunhão e entrei na Cruzada Eucarística Infantil de Vila Arens. Ali, duas vezes por ano tinha aniversário onomástico para comemorar. E já aprendíamos o significado desta festa: antigamente quando os seminaristas eram ordenados padres, trocavam de nome, significando que para se dedicar a Deus era necessário uma mudança total: a começar pelo nome. Dificilmente sabíamos o nome de batismo do padre, mas apenas o que adotavam após ordenação, assim como acontece com o Papa. Apenas após o Concílio Vaticano II é que a mudança de nome não se fez mais necessária. As duas comemorações na paróquia aconteciam no dia primeiro de abril, dia de São Hugo e 15 de novembro, dia de São Alberto Magno. Claro que Padre Hugo e Padre Alberto eram homenageados pelas diversas pastorais da igreja. O primeiro era coadjutor e o segundo o vigário. E pelo menos dois meses antes, dona Leonor, uma das dirigentes da Cruzada, reunia as cerca de 30 crianças e começava a realizar ensaios para apresentações no Salão Paroquial de Vila Arens. E ela era rigorosa nos ensaios, não permitindo brincadeiras, mas exigindo que decorássemos os textos. Durante a apresentação, ela ficava ao lado da cortina, como “ponto”, soprando as palavras que geralmente esquiamos. E era no palco do Salão Paroquial que nós, crianças, junto com outras pastorais, como congregados marianos, apostolado da oração, filhas de Maria, prestávamos nossas homenagens: uns com pequenas peças teatrais outros com grupos de música ou pequenos corais e preenchíamos a noite de homenagens que começava com a missa festiva na igreja e continuava no salão paroquial, completamente lotado, principalmente pelos pais orgulhosos de verem os “atores” se apresentando. Mesmo com toda minha timidez, eu conseguia subir ao palco e me transformar em ator. As peças de sucesso da Cruzada eram “Uma festa gorada”, “A chuva e o bom tempo” e “Os tamancos do diabo”. A primeira mostrava um grupo de meninas preparando a festa de aniversário da professora. Enquanto sorteavam num canto da sala quem faria o que, um grupo de meninos invadia a sala e comia o bolo, frustrando a homenagem final. A segunda mostrava a preocupação das mulheres com roupas no varal com a chuva enquanto outras torciam para que a água caísse e salvar a lavoura. E a terceira, onde eu era o personagem principal, pois me vestia de Diabo, era levar uma moça ao pecado. E os pecados eram os sete capitais: Soberba, Avareza, Luxúria, Ira, Gula, Inveja e Preguiça. E decorávamos estes pecados com facilidade, já que nas aulas de Padre Hugo, ele “criava” fórmulas para a decoração: escolhia a primeira letra de cada pecado e formava a palavra “saligip”. Na semana seguinte, sabíamos os pecados de cor. Mas na apresentação eu precisava o máximo cuidado, pois, encerrado o “espetáculo”, descíamos do palco e íamos cumprimentar o padre aniversariante e que estava sentado na primeira fileira. Dona Leonor já me orientara antes a minha reação: se o padre mostrasse o crucifixo, o diabo tinha que correr de medo. E eu desaparecia rapidamente das vistas do padre, me escondendo atrás das cortinas. Mas o tempo não para de caminhar. Depois de alguns anos, o salão virou o Cine Vila Arens, mas fechou as portas, foi reformado e voltou a ser Salão Paroquial, mas de menor tamanho. A saudade que ficou nos faz viajar pelos palcos da existência nos transformando em atores às vezes sem querer, mas a recordação dos ensinamentos passados pelas pessoas mais experientes mostra que tudo o que vivemos no passado é motivo de enriquecimento em nossas vidas.

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