sábado, 8 de outubro de 2011

A missa das crianças

Missa das crianças na igreja da Vila Arens era assim: padre Hugo celebrando de costas para os fiéis, rezando em latim e padre Alberto, no púlpito, explicando as orações. A celebração, no final da década de 50 – seria errado dizer do século passado? ou tem que ser década de 1950? – começava exatamente às 7h30.
Padre no altar, acompanhado de dois coroinhas que liam as respostas, em latim, num papel plastificado que ficava nos degraus do altar. Claro que não entendíamos uma palavra das orações, mas eu tentava prestar atenção no “Dominus vobiscum...” com o coroinha respondendo “Et cum espiritu tuo”. De lá do alto, padre Alberto, um alemão simpático e agradável, que arranhava o português, mas que as crianças entendiam melhor que o latim rezado no altar, explicava o que significavam aquelas frases.
O celebrante não fazia sermão. O tempo era curto, pois a igreja ficava lotada e, logo em seguida, tinha outra missa. As missas eram de hora em hora e começavam às 5h30. Era exatamente neste horário que minha mãe participava da cerimônia. Depois vinha a das 6h30, com os Congregados Marianos; a seguinte era a nossa missa.
O que deixava as crianças arrepiadas e cheias de fé, era a forma com que o padre pedia para as crianças cantarem: “agora o refrão, todos juntos: Eu confio em Nosso Senhor, com fé, esperança e amor...” As crianças cantavam com toda força do pulmão, a igreja parece que tremia. Eu ficava vermelho – se bem que ainda fico por qualquer coisa... – para gritar a letra da melodia, sem me preocupar muito em cantar dentro do ritmo. Queria ouvir minha voz no meio das 200 ou 300 crianças que lotavam os bancos da igreja. E este era o detalhe que me fazia gostar de padre Alberto: como a missa era das crianças, ele fazia os adultos deixarem lugar para a gente. E os bancos ficavam lotados. Os primeiros eram reservados para as crianças da Cruzada Eucarística Infantil, da qual eu fazia parte. Depois vinham as crianças que estavam se preparando para a Primeira Comunhão e, mais atrás, aquelas que já comungavam normalmente, mas que não faziam parte de nenhum movimento religioso.
Contrariava um pouco aquilo que minha mãe sempre dizia – deixar o lugar para os mais velhos, onde quer que esteja... – mas eu entendia o que o padre queria dizer: se a missa era das crianças, os lugares eram delas! Só não podia chegar atrasado na igreja. Aí, o padre não perdoava a gente: os adultos tomavam conta dos lugares vazios e as crianças atrasadas ficavam em pé. Mas no domingo seguinte, a gente aprendia a lição e chegava mais cedo...
Quando o padre Hugo dizia: “ite missa est” e os coroinhas respondiam: “Deo gratia”, eu já me punha em pé, pois sabia que a cerimônia tinha terminado. Era hora de acompanhar a reunião da Cruzada e, em seguida, passar pela feira à procura de alguma novidade. Passava pela banca de doces, onde meu tio Waldemar era dono. Meu irmão Ademir trabalhava com ele e ganhava um Sonho de Valsa como salário todo domingo. Minha irmã Ana Maria já passara alguns domingos fazendo isso na mesma banca, mas não por muito tempo, pois decidiu me acompanhar na “Cruzadinha”.
Claro que as palavras em Latim sempre foram difíceis de serem entendidas e pronunciadas, mas ver padre Alberto – cujo sobrenome não sei escrever – no púlpito, como um maestro ou caminhando entre os bancos, incentivando as crianças a cantar, sempre me deram a certeza de que Deus sabe escolher as pessoas para o sacerdócio. E padre Alberto tinha um dom especial em dizer as coisas de Deus. Padre Hugo, nas reuniões da Cruzada, explicava o Evangelho, mais uma vez, para que a gente não esquecesse do que Jesus queria nos ensinar.
Foram estas pessoas que me mostraram o caminho e minha mãe, Angelina, sempre me fez caminhar por ele...

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