Quando vejo a biografia deste homem, sinto orgulho de ter
sido seu amigo, seu colega de trabalho, seu aluno na questão de redação, na
paciência, na ética. Conheci o professor Adelino Brandão na década de 1970
quando ele fazia os editoriais do Jornal da Cidade e eu era um mero repórter e
diagramador. Por conta da função de diagramar as páginas internas do jornal,
chegava à redação logo às 8 horas e já encontrava ali, trabalhando seu texto, o
professor Brandão. Um rápido “bom dia” e ficava acompanhando com os olhos o
datilografar do texto do professor que, no dia seguinte, era destaque na página
4 do jornal.
Algumas vezes ele não estava cedo na redação. No início,
imaginei que fossem aulas no Instituto, mas um belo dia, por volta das 11
horas, chega ele sorrindo e vem até mim para dizer que “fui chamado lá em cima”,
disse sorrindo. “No Cia.Com?” pergunto eu. “Não, no G.O.”, diz ele sorrindo. “Queriam
saber o que quis dizer no editorial de hoje”, sorria mais uma vez e sentava
para escrever. Cia.Com era a 2ª Companhia de Comunicações, o quartel, na rua do
Rosário e G.O. era o quartel que foi para Santos e em seu lugar veio o 12º GAC.
Vivíamos, na década citada com os militares no poder. E enquanto “Estadão” e “Jornal
da Tarde” mostravam receitas de bolos ou poemas de Camões, Adelino Brandão era
chamado para explicar o que escrevera. Afinal, a imprensa era a grande
preocupação dos militares, tanto que a censura se fazia presente
constantemente.
Nossas conversas não se limitavam a política – da qual nunca
fomos fãs, mas aprendemos a conviver por necessidade – mas principalmente com o
escrever. Euclides da Cunha sempre foi uma referência para Adelino Brandão. Era
comum vê-lo entregar um texto sobre o autor de “Os sertões” e depois o
Editorial. Quando me entregava o texto do dia, brincava com ele: “atrasado hoje
professor?”. Rindo, Brandão completava: “Não! Euclides da Cunha hoje é mais
importante!”.
Tivemos uma longa convivência nesta década. Deixei o jornal,
me mudei para Campinas e fui reencontrá-lo já neste milênio. O professor me
liga para me dar os parabéns ao ver meu nome no expediente do Jornal de
Jundiaí. Relembramos épocas passadas no outro veículo de comunicação, falamos
sobre os velhos militares e dos quartéis que deixaram a cidade e ele me pede um
favor: publicar um texto sobre Semana Euclidiana. “Seu amigo Euclides
professor?”, brinco, lembrando outros tempos. “Não consigo não falar sobre a
obra deste homem”, completa Brandão.
Premiado em vários concursos literários, autor de uma
infinidade de livros, a maioria sobre Euclides da Cunha, Adelino Brandão também
fez parte da Academia Jundiaiense de Letras. Não nos encontramos lá, mas nunca
perguntei por que deixou sua cadeira. Uma noite de novembro de 2004 quando
estou de folga do trabalho, numa noite de sábado, meu celular toca e o editor
de plantão pergunta se poderia dar como manchete a morte de Adelino Brandão.
Fico surpreso com a notícia. Na minha memória vem toda a história vivida com
este homem. Não me lembro o que respondi ao editor, mas acabo vendo este homem
andando pelos corredores do Jornal da Cidade com pastas debaixo do braço,
muitas delas cheias provas de alunos que aproveitava para corrigir na redação e
outras com material sobre Euclides da Cunha. Assim era o professor,
historiador, folclorista, advogado Adelino Brandão. Ou simplesmente um amigo
inesquecível!
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