quinta-feira, 10 de maio de 2012

O presente

Dia das mães era sempre assim: seu Alcindo liberava o dinheiro no início da semana, e nós, os filhos, iniciávamos a pesquisa para saber o que comprar para dona Angelina. E a escolha nem sempre era fácil! Afinal, chegar a uma opinião só, com seis pessoas pensando diferente, realmente não era tarefa fácil. E os presentes não podiam custar muito: meia dúzia de panos de prato, uma toalha nova para a mesa da cozinha, uma panela de pressão que chegava ao mercado, um ebulidor para fazer café... Ana Maria, por ser a única mulher do grupo de irmãos, tinha a liberdade para chegar até nossa mãe e “pesquisar” o que ela queria ganhar. E dona Angelina tinha sempre a mesma opinião: “sejam obedientes, respeitem os mais velhos”. Claro que isso a gente fazia, mas nada mais justo do que presentear a mãe, no dia instituído pelo comércio. E tínhamos de segunda a sexta-feira para “checar” no mercado o produto e o preço, para ver se o dinheiro iria dar. Ademir, o mais velho, e que já ganhava algum dinheiro, se propunha a completar o que faltava, desde que não fosse muito dinheiro. E numa bela semana, a idéia do presente acabou sendo igual entre dois irmãos: eu e Ana Maria tínhamos visto o mesmo presente, no mesmo lugar e que recebeu a aprovação de todos em questão de segundos. Os dois que descobriram o presente, tinham, agora, a missão de checar o preço e verificar se havia, em alguma loja, um preço melhor. Pesquisa feita, presente definido, a ordem, agora, era comprar e definir quem faria a entrega do pacote. Mas este presente era diferente: um conjunto de latas pra guardar mantimentos. E comentamos que elas enfeitavam o balcão da loja, uma sobre a outra e que poderiam ser usadas desta forma em casa ou sobre o armário de cozinha, uma ao lado da outra. Já tínhamos a ideia do que iria em qual lata: a maior seria o arroz, a primeira abaixo dela, o feijão. E seguiam-se na ordem: açúcar, farinha de trigo e farinha de mandioca. Como eram cinco latas, imaginávamos que cada um entregaria uma, de acordo com o tamanho. Ademir, o mais velho, entregaria o cartão. Resolvemos, até, inverter a ordem de entrega: Alberto, o mais novo, entregaria a lata maior, Antonio, a outra, Osmar a do meio, depois eu e Ana Maria ficaríamos com a s menores. E fomos à compra e, ali, a surpresa e um ar de frustração... O vendedor foi ao depósito e voltou com uma caixa fechada, abrindo para nos mostrar o conteúdo. Imaginávamos que aquela era a lata maior, mas a surpresa é que ele retirou a lata de dentro da caixa, tirando a tampa da mesma, dentro dela, outra lata que, aberta, continha outra dentro e mais outra e mais outra... Olhei para Ana Maria com cara de surpresa e tive o mesmo retorno. Latas recolocadas uma dentro da outra, pacote feito, voltamos para casa, carregando um peso enorme. Difícil, agora, era saber como entregar para nossa mãe. Solução encontrada, no dia das mães, logo cedo, nos preparamos pra a entrega do presente. Dona Angelina tinha ido,como de costume, à missa das 5h30 e chegava em casa por volta das 7 horas. Quando abriu a porta da cozinha, deu de cara com os filhos, os seis, segurando ou pelo menos, encostando a mão no pacote. Claro que dona Angelina recebeu o abraço de todos, depois de sugerir que a caixa fosse colocada sobre a mesa, para que não ficássemos carregando tanto peso. Claro, também, que percebemos duas lágrimas de alegria escorrendo debaixo dos óculos. Claro, também, que quem abriuo pacote fomos nós. Cada um puxando um pedaço do papel, rasgando tudo. E claro, ainda, que Ademir retirou a lata de dentro da caixa, que Ana Maria tirou as outras latas de dentro da maior, que eu retirei as outras de dentro desta até que as cinco latas estavam dispostas sobre a mesa e que, agora, cada um pegou uma e entregou nas mãos de dona Angelina. Claro, principalmente, que seu Alcindo ficou num canto da cozinha, sorrindo, vendo a alegria de todos com um presente inusitado. Coisa que a gente nunca tinha visto antes...

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