terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Doces tardes de domingo (No meu tempo de criança XV)

Fim de semana se aproximando e todas as quintas-feiras eu e minhas amiguinhas fazíamos planos, combinando como seria nossos domingos. Tínhamos várias opções de passeios: Fazer um pic-nic, ir às matinês num cinema próximo de casa, ao parque de diversões ou ao circo quando este se instalava na cidade. Chegando domingo nossos pais nos liberavam somente após o almoço, e quando era 13 horas eu começava a me aprontar para ir ao cine República, cuja sessão se iniciava às 14horas. Não fazíamos questão quanto ao filme a ser exibido, qualquer que fosse estava ótimo, mesmo os de “bang-bang” que eu detestava, não reclamava porque o que valia mesmo era estarmos juntos. As fileiras de poltronas lotavam só com amigos. Quando anunciavam o seriado após o filme ter terminado, a plateia vinha abaixo ao apresentarem acompanhado com música chinesa “Os tambores de Fú Manchú“. Assobios, palmas, pés batendo no assoalho de madeira velha, produziam um barulho ensurdecedor. Depois reinava silêncio completo durante o seriado, que acabava sempre com finais intrigantes, o que fazia as crianças voltar no próximo domingo. Era muito divertida a volta para casa, os comentários uns querendo opinar mais que os outros. Com isso nossa semana se encerrava com alegria. Outras vezes era o circo, que naquela época havia dramatizações na arena. Sempre histórias que comoviam e no final entrava o palhaço para animar os rostinhos emocionados. Uma vez as arquibancadas estavam lotadas, com dificuldade subimos na mais alta das tábuas pedindo licença e nos equilibrando, até sentarmos tranquilos assistindo aos melodramas. Foi quando a lona já gasta começou a balançar fortemente pela ventania do temporal que se formava. De repente escureceu, virou noite literalmente, as luzes dos postes se acenderam e os trovões impediam que ouvíssemos os atores.E a chuva veio forte ,muito forte começando a formar um rio de água barrenta impedindo o fim da peça. Foi formando uma lagoa dentro do circo, ficamos apavorados, porque as goteiras nos molhavam, pingando das velhas lonas. Quando o tempo se acalmou saímos todos sem graça, pois estava encerrado o espetáculo. Era reservada também as tardes de domingo para visitar os parentes mais próximos. Íamos à casa da minha avó, onde moravam tios e primos no centro da cidade. Saíamos após o almoço, do bairro de Vila Arens, e caminhávamos cerca de uma hora sem pressa, observando casas, jardins e quando atravessávamos a ponte do rio Guapeva, metade do caminho estava feito. Por fim éramos recebidos com o carinho de todos, principalmente da vó Delphina que nos servia café com pastel frito na hora. Após a conversa em dia ,e brincarmos com os primos, despedíamos com: “bença vó, bença tio”. Era um tal de beijar a mão de todos... Ao retornarmos para casa, meu pai nos levava em frente a matriz Nossa Senhora do Desterro, onde funcionava uma fonte iluminada, cujas águas dançavam coloridas, e muita gente sentava nos bancos do jardim conversando, namorando, enquanto crianças corriam sem preocupação. Dai papai nos convidava para jantarmos num restaurante assobradado ao lado da igreja. Tudo era festa, voltávamos de táxi. Outras vezes fazíamos o caminho de volta a pé, e quando estava chegando perto da fábrica Argos,um imenso parque de diversões ali se encontrava,e resolvemos parar. Meu irmão ficava na barraca de pesca, eu na de argolas, a mamãe e o papai na de tiro ao alvo, todos perto uns dos outros. Acontece que numa noite o parque estava lotado e era fila para a roda gigante, para o carrossel e outros brinquedos.Como nos movíamos rápidos para pegar os lugares, de repente percebi que não encontrava meu irmão, nem meus pais. O desespero bateu, comecei a andar sem rumo, olhando para todos os lados, eu era muito pequena no meio daquele pessoal alto. Com frio na barriga tomei a decisão de voltar sozinha até minha casa. Sai da multidão e comecei andar rápido, o ar me faltava ,foi quando avistei a torre da igreja da Vila Arens, que meu coração desacelerou,e caminhando até a esquina da rua da estação ferroviária, contemplei a igreja em todo seu esplendor me parecia mais linda ainda. Ufa! Estava salva, pois, eu morava ao lado da mesma. Cheguei em frente ao enorme portão de ferro trabalhado em desenhos de arabesco e não consegui abrí-lo. Chamei primeiro em voz fraca: “Nona, noona...” Depois gritei “noonaaa”, e as luzes do sobrado se acenderam. Alívio, estava salva. Ela me acolheu assustada. “Ma dove sta tuo papa?” “Não sei ,eu me perdi.” “Quello stupido!”. Ela estava muito nervosa mesmo. “Veni qui povereta, bere questa acqua con zucchero.” Logo em seguida meus pais chegaram. Houve pequena discussão e fomos todos dormir. Então eu me senti leve como uma pluma, toda angústia passou e desfrutei do aconchego com meus pais. (Uma história de Marly Pirani da Costa. Texto: Marly Pirani da Costa

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