segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

O cuco que fazia Claudia sorrir (No meu tempo de criança – XVIII)

Por um breve momento e por extrema necessidade, a menina que brinca na rua com os primos para e entra na casa com o objetivo de aliviar-se o mais depressa possível e voltar para seus afazeres infantis. Sobe a escada depressa e avança pelo corredor principal. Seus pés nus tocam o piso de madeira da casa do avô e, pela primeira vez uma suave badalada lhe desperta a atenção. Presa à parede, uma caixa de madeira esculpida em forma de ninho abriga dois pássaros. Em seu miolo, uma pequena porta. De duas correntes pendem pesos em forma de pinhas e um coração de madeira movimenta-se sozinho de um lado para o outro. A menina se aproxima, mas não os toca. Fascinada, detém-se mais um momento, mas a necessidade a chama. Em seu regresso, ainda fascinada pelo som da caixa, fica novamente paralisada a contemplar o balanço ritmado do pêndulo quando para sua surpresa a porta se abre e um passarinho grita ‘cuco’ por algumas vezes. Palmas para o passarinho. André, o avô que cochilava após o almoço a encontra e imediatamente após ser descoberto vê-se rodeado de perguntas. Paciente como era, exímio pescador e de imenso coração, a põe sentada no colo e lhe explica sobre o relógio, seu funcionamento, origem, e não bastando atender suas indagações, a ergue nos braços e movimentando suavemente com as pontas dos dedos, acelera os ponteiros e demonstra o que explicou para o deleite da neta. Mais gritos e palmas para o passarinho. A brincadeira foi esquecida, os primos abandonados e o som do relógio e da voz do avô foram o divisor de águas naquele universo. Cresceu ao som do cuco e muitas vezes esquecia de brincar apenas para ficar ali, na sala, olhando o objeto e aguardando o momento quando a hora completasse e o pequeno passarinho projetava-se para fora da caixa em um sonoro grito. Ainda hoje a caixa a fascina. Foi presente ainda em vida do avô. Veio todo embrulhado de Campinas para São Paulo onde ornamenta a parede da casa do pai. Ali, seus sobrinhos e filhos viveram as mesmas emoções da menina e seu pai, tal como seu avô, a explicar sobre o objeto, seu funcionamento e origem em um ciclo sem fim no pulsar das horas. Em meu tempo de criança, contemplar um simples relógio cuco era (e ainda é) motivo para sorrir. (Uma história de Claudia Hespanha. Texto: Claudia Hespanha)

Um comentário:

  1. Como protagonista da segunda parte da história, verídica, ainda me emociono com estas lembranças cuidadosamente guardadas e agora reveladas.

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