terça-feira, 21 de janeiro de 2014

O pecado da inveja (No meu tempo de criança XI)

No meu tempo de criança, acho que posso dizer, sem muito exagero, que eu vivia mais ou menos em odor de santidade. Viciado em hóstia e traficante de água benta. Os pecados vieram mais tarde, com a testosterona, e, bem por isso, foram pecados de fraqueza, não foram pecados de maldade, se é que a teologia permite essa distinção. Mas não pense você, leitor amigo, que coroinha não se diverte. Eu era coroinha graduado. Turiferário, para ser exato. Turiferário é aquele coroinha que fica fumigando a igreja com fumaça de incenso. Pois bem, havia uma competição clandestina, entre os turiferários do colégio, para ver quem era capaz de criar a maior nuvem de fumaça. Eu era bom nisso. Meu fumaçalelê era um verdadeiro nevoeiro litúrgico. Assim mesmo, sou obrigado a confessar o pecado da inveja. Inveja daqueles coroinhas cuja função era cuidar das galhetas. Galhetas, para quem não sabe, são aquelas duas garrafinhas, com vinho e com água, usadas na consagração. Havia, entre aqueles coroinhas privilegiados, uma competição clandestina para ver quem conseguia derramar mais vinho no cálice do padre. O padre levantava um pouco a cálice, para sinalizar que bastava, e o coroinha levantava a galheta, para continuar derramando. O campeão, que tinha o apelido de Quico, conseguiu, uma vez, esvaziar a galheta. Agora que estou velho, com a testosterona já no tanque de reserva, acho que vou me candidatar a diácono, para um pouco de divertimento inocente. (história de Luiz Haroldo Gomes de Soutello. Texto: Luiz Haroldo)

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